Hoje quem empresta sua voz é Marta Elizabete de Souza (*), para o poema “Zaratrusta”.
Clique aqui e confira o décimo sétimo vídeo do Projeto na voz de Marta Elizabete de Souza
“Os homens são animais de rebanho. Não serei ovelha.
Andarei sozinho e sem medo, sempre que for possível.
Contrariarei o coro dos contentes.
Desafiarei a falsa alegria do alarido dos amontoados de gente.
Recusarei a banalização do encontro. Não amarei a todos.
Não faço questão de que todos me apreciem.
Assumirei as minhas responsabilidades por mim mesmo.
Não depositarei no alheio, os fardos que são os meus.
Não participarei do pacto que faz da fraqueza, virtude.
Não enfeitarei com as cores do bem e da alegria,
a essa interdependência compulsória
que nos une a todos e nos condena, em servidão, ao outro.
A força impositiva que nos amalgama não requer o meu beneplácito.
A tua potencia, entretanto, também não me desnorteará.
Sei que não posso sempre só, mas sei que a solidão pode ser uma escolha.
Estarei entre os homens na cidade, comerei e beberei com eles,
Mas nunca me farei fácil apenas para agradá-los,
para cooptar a boa vontade da sua companhia.
Desdenho do calor covarde que conforta os que compartilham
a roda ao redor do fogo, temerosos de lançar o seu olhar
para a imensidão escura que jaz às suas costas.
Quero essa consciência sempre comigo, bússola a me guiar.
A todo o momento posso escolher partir,
deixar o grupo, opinar de modo diverso contra todo o senso comum,
a multidão não me intimidará.
Viajante solitário, não recuso o homem, o humano que jaz em mim,
Mas o quero de pé em seu orgulho e dignidade
e não como um mendigo das migalhas de afeto
dos favores e das boas vontades dos que são mais covardes do que eu..
Não temo que morte venha me colher em solidão.
Não lhe concederei, entretanto que me receba em condição de desamparo.
Sei que amizade pode existir e que ela é um acaso. O encontro amoroso uma loteria.
Sei que o raro e extraordinário é sempre exceção
Fraqueza e medo é que pretendem impôr-los como norma e como meta..
Se coopero é por me reconhecer incapaz de obter sozinho,
Mas a ninguém seduzirei para coopere comigo.
A autonomia de cada organismo é regida pelos ritmos do músculo cardíaco.
E em cada peito bate um só coração.
Cada pulmão respira somente o ar que lhes é necessário.
Que cada um ouse responder por si, eis a ponderação.”
Matraga
O projeto “Palavra indisciplinada” objetiva compartilhar poemas escritos por Marcus Vinícius de Oliveira Silva, o Marcus Matraga. O Instituto Silvia Lane prepara este projeto com o convite a parceiras/os/es e amigas/os/es para emprestarem sua voz às palavras indisciplinadas, para que ecoem com vivacidade, tal como é a memória: movente e pulsante. Vozes gravadas em vídeos que mostrarão os poemas de Marcus Matraga.
O projeto tem como inspiração o livro recém-publicado “Poemecídios e outras mortes” (**). Os vídeos estarão postados no Memorial Matraga (***), que reúne conteúdos sobre a vida e obra do Marcus, e está em permanente construção.
Acompanhe o projeto “Palavra indisciplinada” e conheça e Memorial Matraga!
(*) Marta Elizabete de Souza, Belo Horizonte-MG. Psicóloga da Luta antimanicomial, do Fórum Mineiro de Saúde Mental que integra a RENILA (Rede Nacional Internúcleos da Luta Antimanicomial).
(**) MATRAGA, Marcus – Poemicídios e outras mortes. São Paulo: Hucitec, 2021.
(***) www.memorialmatraga.com.br