MEMORIAL MARCUS MATRAGA
marco de 2017-02-26
“Não preciso tomar toda a sopa para saber se ela está estragada, basta uma colherada”
Em Novembro de 2011,
Encontro com Gleisi Hoffmann, Palácio do Planalto
Igrejas neopentecostais utilizam as suas bases parlamentares para alterar a legislação,
normas, portarias ministeriais, com o objetivo de introduzir nos aparelhos da saúde as
comunidades terapêuticas.
A pressão da bancada evangélica do Congresso sobre o governo utiliza de mecanismos
nefastos como: dados e análises distorcidas de pesquisas sem credibilidade na comunidade
científica; investe numa das mais perversas campanhas na mídia tradicional. O plano é
vender a ideia de que há uma epidemia de crack, na tentativa de gerar pânico na sociedade
e, consequentemente, criar um ambiente autorizador potente para as comunidades
aparecerem no cenário como resposta capaz de conter o avanço do número de usuários de
crack e outras drogas e reverter a tal epidemia.
Havia grande tensão e mobilização nas entidades da luta antimanicomial para tentar
segurar o avanço desse setor conservador que buscava, de fato, acessar os recursos da
saúde para assegurar lucros e benefícios desse segmento por meio das ditas Comunidades
Terapêuticas. Nesse cenário, os neopentecostais contavam ainda com o primeiro edital do
Ministério da Saúde que pretendia destinar 100 milhões de reais para as CTs que
integrassem o Plano Crack.
É preciso destacar que decisões das duas últimas conferências de Saúde e de Saúde Mental
recusaram o financiamento público para as Comunidades Terapêuticas e ainda mais sua
inclusão à rede de atenção em álcool e outras drogas do SUS dois meses antes da edição do
Plano Crack e do citado edital. O Coordenador de Saúde Mental do MS e outros setores da
Saúde e da Luta antimanicomial trataram de introduzir cláusulas de proteção e requisitos no
próprio edital que impediu uma avalanche de CTs como unidades de saúde.
Parte do governo Dilma tentou segurar essa voracidade da base neopentecostal do
Congresso. Entre estes aliados da luta antimanicomial, o ministro Gilberto Carvalho, da
Secretaria Geral da Presidência da República que, já sentindo a possibilidade da perda na
queda de braço para os neopentecostais, marcou uma reunião entre a ministra Gleisi e
representantes do Conselho Federal de Psicologia.
Entre os representantes do CFP, Marcus Matraga. O clima da reunião foi muito tenso. Havia
uma clara intenção da ministra em incluir as comunidades terapêuticas. Marcus refutou
categoricamente cada um dos argumentos apresentados pela ministra. Na sequência
Marcus fez a seguinte fala para a ministra Gleisi: “Essas comunidades vão reintroduzir a
segregação como modo de tratamento, objetivo oposto ao que orienta os serviços
substitutivos. Saímos de uma inspeção e o que vimos nos deixou estarrecidos pelo
desrespeito aos usuários ainda hoje, pela falta de tratamento adequado, pelas violações de
direitos humanos, parecíamos estar nos velhos e conhecidos manicômios ou seria adequado
algum usuário carregar pedras como forma tratamento? Seria tratamento retirar filhos de
mães usuárias, retirar seu poder pátrio ou seria ainda alguma forma de tratar impor
qualquer forma de credo?”
A fala eloquente e assertiva de Marcus Vinicius notadamente incomodou a ministra que
levantou a voz, ameaçou sair da reunião e ainda tentou menosprezar a inspeção `as
comunidades terapêuticas dizendo que a amostra apresentada era muito pequena, uma vez
que foram visitadas apenas 68 unidades de um universo de 3.000. Marcus didaticamente e
se valendo de seu repertório de metáforas, disparou: “não precisamos tomar toda a sopa
para saber que ela está estragada não é mesmo ministra? basta uma colherada!
Se o governo insistir em incluir as comunidades terapêuticas como aparelho de saúde, nós
vamos voltar aqui, daqui a dois anos, para ouvir que não deu certo. Já sabemos que não vai
dar certo. Já vimos isso!
As comunidades terapêuticas nada mais são do que os manicômios que nós já conhecemos
o seu histórico de segregação, de maus tratos, torturas que levaram o Brasil à condenação
na Corte Interamericana de Direitos Humanos. Vocês querem novos Juqueris, novos
Damiões Ximenes, usuários torturados, queimados em leitos? As CTs são manicômios com
uma nova roupagem. Mas não deixam de ser manicômios. Não há novidade nenhuma nisso.
Não queremos a volta de um modelo fracassado e segregador. Vamos discutir como avançar
a reforma antimanicomial e não como retroceder”.
Não se ouve falar mais da epidemia de crack nos principais veículos de comunicação. E as
Comunidades Terapêuticas seguem prometendo cura em nome de Jesus.
Marcus não pôde voltar.
As igrejas neopentecostais aumentaram o número de parlamentares nas últimas eleições
em 45%, segundo o DIAP.
A ministra caiu.
A base parlamentar das igrejas neopentecostais apoiou o golpe de 17 de abril de 2015.
12 de outubro de 2012
1a Vara – Distrito Federal
Federação Brasileira de Hospitais X Marcus Vinícius de Oliveira
Durante longos 10 anos, tramitou processo movido pela Federação Brasileira de Hospitais,
no qual a FBH pedia indenização por danos morais e tentava censurar a divulgação e
distribuição do livro “A Instituição Sinistra – Morte Violentas em Hospitais Psiquiátricos no
Brasil e o Vídeo “Tribunal dos Crimes da Paz, o Hospital Psiquiátrico no Banco dos réus “,
ambas publicações do CFP, organizadas por Marcus Matraga.
O livro apresenta relatos de 7 crimes ocorridos dentro de hospitais psiquiátricos do Brasil. Os
relatos foram elaborados por entidades da luta antimanicomial e de Direitos Humanos, a
partir de pesquisa de casos publicados em jornais e/ou outros veículos.
O vídeo de 2001 traz o julgamento do Hospital psiquiátrico realizado no Auditório Petrônio
Portela , Senado Federal, onde o CFP colocou o Hospital Psiquiátrico no banco dos réus para
ser
julgado pelos crimes cometidos ao logo de muitos anos, em nome da “ordem social”.
Em sua sentença o juiz observa que ambas as obras são uma críticas construtivas e “são
manifestações de pensamento e de informações que se inserem no direito da liberdade de
expressão”.
o Juiz julgou o processo como improcedente e condenou a Federação Brasileira de
Hospitais a pagar 5.000 reais naquela ocasião.
Marcus, ao receber a notícia transbordava de alegria, e sugeriu que o CFP divulgasse
imediatamente o resultado do processo a todas as organizações e movimentos sociais que
estavam sendo criminalizados, onde havia uma clara intenção de reprimir suas iniciativas,
suas lutas e afasta-los do centro dos debates das políticas públicas.
Marcus, na ocasião, afirmou “essa é uma vitória importante no contexto atual de
criminalização dos movimentos sociais em que as disputas são levadas à justiça com o claro
intuito de calar nossas vozes que questionamos práticas violentas, como as realizadas pelos
hospitais psiquiátricos. Entendo que essa vitória é de toda a militância antimanicomial que
teve assim reafirmado o horizonte ético que nos motiva a seguir em luta pelos direitos dos
usuários da saúde mental”.
Além dessa fala institucional, Marcus ao telefone comigo, disse: “ganhar uma desses caras
nos dá mais fôlego pra gente entrar em mais umas 100 disputas, não é mesmo?”
Ministério da Justiça, 28 de agosto de 2012,
Posse no CONAD
É preciso destacar a tentativa da Secretaria Nacional de Politicas sobre drogas (SENAD) de
tentar barrar o nome do Marcus Vinícius para o Conselho Nacional de políticas sobre
Drogas(CONAD) sob a alegação de que ele não tinha experiência comprovada na área para
integrar aquele conselho.
“Ainda bem que eles estão alegando algo descomunal, será fácil desmontar essa farsa. Se
eles tivessem dito que sou um problematizador, que vou dar trabalho para eles, até que
poderia concordar, mas com essa desculpa não podemos aceitar”, comentou Marcus
Matraga.
Marcus marchou para a SENAD, no mesmo dia em que soube da tentativa de veto ao seu
nome, com o Dr Fernando Nazaré. Na volta, com seu sorriso largo, anunciou: “estamos no
CONAD, a diplomacia do Fernando aliada a minha fala de uns 10 minutos, fez logo com
que eles entendessem que sou da área. quase me pediram desculpas. Nem me pediram
mais para entregar os documentos para comprovar minha experiência, mas deixei la, vai
que eles pensem em mudar de ideia, terão pelo menos o trabalho de apresentar uma
outra desculpa”.
O ministro da Justiça, José Eduardo Cardozo, empossou no dia 28 de agosto de 2012
Marcus Vinicius para integrar Conselho Nacional de Políticas sobre Drogas (Conad) como
representante do Conselho Federal de Psicologia.
Na ocasião, o ministro falou do papel do Conad e da importância da Política Nacional
sobre drogas. “Este Conselho, pela representação que tem, é fórum fundamental para
esse debate”, afirmou o ministro.
Vale lembrar que o Conad tem como objetivos acompanhar a execução da política
nacional sobre drogas, entre outras atribuições. As reuniões ordinárias naquele período
deveriam acontecem quatro vezes ao ano e contavam com participação de 28
conselheiros. A próxima reunião prevista, após a posse de Marcus Vinicius, para novembro
daquele ano de 2012 não aconteceu. Enquanto isso, avançava o projeto de lei 7.663/2010
do então deputado Osmar Terra no Congresso Nacional.
O CONAD continuou no começo de 2013 completamente paralisado, sem participar de
qualquer debate sobre a Politica Nacional de Drogas ou sobre os projetos de lei que
estavam em plena discussão na sociedade e no Congresso Nacional. Em 11 de junho de
2013, Marcus Vinicius entregou ao Ministro e membros do CONAD uma carta onde
apresentava duras críticas ao papel do Conad no combate às drogas. Ele sugeriu que o
governo revisse as atribuições do conselho.
Destacou que o Conad estava exercendo “papel figurativo, acessório e irrelevante”, e
estava sendo “absolutamente deplorável e omisso” em sua atuação. Ressaltou que os
problemas relacionados às drogas no Brasil são combatidos com políticas questionáveis, sem
levar em conta a colaboração técnica do conselho e afirmou que o CFP, entidade que
representava não iria pactuar com isso.
“O Conad tem sido ignorado desde a preparação e lançamento de um dos principais
projetos do governo da presidenta Dilma, Crack, é possível vencer”, afirmava Marcus
Vinícius na carta.
O conselho “permanece alijado de qualquer manifestação em relação ao controverso
Projeto de Lei 7.663/2010 do deputado Osmar Terra, marcado por inúmeras divergências de
opinião, tanto por parte de especialistas, quanto do ponto de vista das orientações entre os
vários ministérios que compõem o governo”, destacou Marcus.
Fez ainda duras críticas ao projeto do deputado que tornava mais rigorosa a Lei para os
usuários, prevê internação involuntária de usuários, a pedido da família e de agentes
públicos, e a isenção fiscal às empresas que empregarem dependentes químicos em
recuperação.
O Ministério da Justiça nunca se manifestou sobre a carta.